21/03/2009

Culpa

Hoje estou sem grana, só com dinheiro suficiente para voltar para casa. Eis que encontrei algumas moedas, e resolvi comprar uma água mineral com gás, para ver se me acordo um pouco. Na porta da lancheria encontrei um garoto que estava pedindo esmolas, e adiantei a situação, dizendo que não tinha dinheiro. Enquanto estava na fila, fitava-o pela janela do lugar, e precisei trocar a água por outra sem gás para poder comprar pelo menos um chocolatinho de R$0,40, pois não conseguiria sair de lá sem dar-lhe nada. Na saída, ao contrário da minha empolgação, ele recebeu o tal chocolate com desapontamento, olhando para a garrafa da água como se me julgasse. Percebi que não estava sozinho, havia outra criança menor, com quem ele dividiu o tal chocolate sem muita empolgação.
Me senti muito culpada e com raiva de mim mesma, afinal de contas não tenho obrigação de resolver todos os problemas do mundo, e sou absolutamente contra todo o tipo de esmolas, embora já tenha dado a minha (des)contribuição várias e várias vezes.
...
Tenho uma tia muito querida que me explicou sua teoria a respeito da vida, com a qual acabei concordando após muita resistência. É a teoria da culpa.

Se alguém morre, choramos por nos sentirmos culpados pelas palavras que falamos (ou deixamos de falar), pelos momentos que abrimos mão de passarmos junto àquela pessoa em troca de compromissos vazios que certamente poderiam ser adiados ou mesmo cancelados.

Se saímos de uma empresa, sofremos pela revolução que não fizemos.

Quando um relacionamento acaba, sofremos pelo quanto não nos empenhamos para que ele desse certo.

Minha tia vive um dia de cada vez, fazendo o possível para não sentir-se culpada por nada, pois julga assim ter encontrado a fórmula para a sua felicidade.

Acho que na verdade sou uma hipócrita, movida pela auto-piedade e culpa. Sofro pelo que será de mim após uma perda, pelo que não terei mais, e pelo que deveria ter feito. Sofro pelo ser humano que não me tornei, e reluto em admitir meus acertos, por pura auto-comiseração.

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Culpa

Hoje estou sem grana, só com dinheiro suficiente para voltar para casa. Eis que encontrei algumas moedas, e resolvi comprar uma água mineral com gás, para ver se me acordo um pouco. Na porta da lancheria encontrei um garoto que estava pedindo esmolas, e adiantei a situação, dizendo que não tinha dinheiro. Enquanto estava na fila, fitava-o pela janela do lugar, e precisei trocar a água por outra sem gás para poder comprar pelo menos um chocolatinho de R$0,40, pois não conseguiria sair de lá sem dar-lhe nada. Na saída, ao contrário da minha empolgação, ele recebeu o tal chocolate com desapontamento, olhando para a garrafa da água como se me julgasse. Percebi que não estava sozinho, havia outra criança menor, com quem ele dividiu o tal chocolate sem muita empolgação.
Me senti muito culpada e com raiva de mim mesma, afinal de contas não tenho obrigação de resolver todos os problemas do mundo, e sou absolutamente contra todo o tipo de esmolas, embora já tenha dado a minha (des)contribuição várias e várias vezes.
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Tenho uma tia muito querida que me explicou sua teoria a respeito da vida, com a qual acabei concordando após muita resistência. É a teoria da culpa.

Se alguém morre, choramos por nos sentirmos culpados pelas palavras que falamos (ou deixamos de falar), pelos momentos que abrimos mão de passarmos junto àquela pessoa em troca de compromissos vazios que certamente poderiam ser adiados ou mesmo cancelados.

Se saímos de uma empresa, sofremos pela revolução que não fizemos.

Quando um relacionamento acaba, sofremos pelo quanto não nos empenhamos para que ele desse certo.

Minha tia vive um dia de cada vez, fazendo o possível para não sentir-se culpada por nada, pois julga assim ter encontrado a fórmula para a sua felicidade.

Acho que na verdade sou uma hipócrita, movida pela auto-piedade e culpa. Sofro pelo que será de mim após uma perda, pelo que não terei mais, e pelo que deveria ter feito. Sofro pelo ser humano que não me tornei, e reluto em admitir meus acertos, por pura auto-comiseração.